CD Fiocruz: Enfrentamento Às Questões de Segurança Nos Campi Do Rio e RRA São Temas Da Reunião de Fevereiro

Por
David Barbosa, Gustavo Mendelsohn de Carvalho e Leonardo Azevedo (CCS)
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O Conselho Deliberativo se reuniu nos dias 13 e 14 de fevereiro, na Residência Oficial, no Campus de Manguinhos, para a primeira reunião do ano. Entre os assuntos abordados: plano de ações estruturadas de curto e médio prazos para enfrentar as questões de segurança nos campi da Fiocruz; Reconhecimento de Resultados de Aprendizagem (RRA); diretrizes para as eleições nas unidades; e análise da política do novo presidente dos Estados Unidos e os seus desdobramentos. 

Durante a reunião, o pesquisador Wilson Savino recebeu do embaixador da França no Brasil, Emmanuel Lenain, o título de cavaleiro da Ordem Nacional do Mérito.

Violência no entorno dos campi

O diretor-executivo da Fiocruz, Juliano Lima, apresentou ao CD um plano de ações estruturadas de curto e médio prazos para enfrentar as questões de segurança nos campi da Fiocruz no Rio de Janeiro. Juliano informou que uma reunião sobre o assunto foi realizada em janeiro com os diretores do Rio e ressaltou que é preciso implementar mudanças significativas e rápidas para ampliar a segurança e mitigar os riscos. 

Plano apresentado por Juliano Lima inclui treinamentos, ações de comunicação e apoio da Polícia Federal e da Cruz Vermelha Internacional. Foto: Peter Ilicciev (CCS)

O diretor-executivo destacou como premissas a imprevisibilidade característica das situações de conflito e a necessidade de reduzir o tempo de comunicação de risco, mesmo no cenário em que a informação qualificada demanda tempo. Juliano considera que o contexto exige antecipação e uma conduta conservadora para proteger as pessoas. 

De acordo com o diretor-executivo, o plano está baseado em tornar as pessoas mais capazes de compreender o que fazer e as diferenças de condutas em situações de risco. "Quando tem um incêndio, a orientação é sair, e, mesmo assim, não é sair de qualquer jeito e sim pelo lugar correto e da maneira correta. Quando há um confronto armado, a orientação é buscar abrigo para se proteger”.

O primeiro eixo do plano é o treinamento, com a implantação de um curso regular e permanente sobre condutas em situação de conflito armado nas imediações. O foco serão as áreas do Campus Manguinhos-Maré mapeadas como mais vulneráveis e que exigem condutas específicas. Além do curso para o público mais vulnerável, também estarão disponíveis materiais explicativos e campanhas permanentes para esclarecer e orientar a conduta geral dos trabalhadores para esse tipo de situação. O segundo eixo trata da reorganização da governança e dos fluxos de decisão. Um comitê para manejo de situações decorrentes de conflitos armados será instituído por portaria. A estratégia atual dos grupos formados para difundir informações de segurança será revista.  

O terceiro eixo do plano trata da comunicação. Prevê a elaboração de diversos materiais para apoiar a segurança na condução das ações operativas e no acionamento dos planos de contingência. Também estão propostos novo fluxo e ferramenta oficial para os informes de segurança. O quarto eixo trata de barreiras de proteção físicas. O seguinte, do controle de acesso aos campi. O sexto eixo é dedicado à segmentação e planos específicos. O apoio psicológico aos trabalhadores e articulação política também estão previstos. Além disso, para uma abordagem estruturante, de médio prazo, contará com apoio externo, incluindo Polícia Federal, Cruz Vermelha Internacional e empresa especializada em segurança.

RRA

A manhã do segundo dia de reunião foi aberta com a discussão sobre a Medida Provisória nº. 1.286/2024, publicada no final do ano passado. Embora institua o Reconhecimento de Recursos de Aprendizagem (RRA) para servidores da Fundação, reivindicação do Sindicato dos Trabalhadores da Fiocruz (Asfoc-SN) desde 2014, o texto inclui pontos que representam barreiras para o alcance do benefício, em especial a definição de um tempo de cinco anos anteriores ao início do processo de requerimento do benefício para contabilização das atividades que compõem o grid e a exigência de mestrado como requisito para acesso ao RRA 3. 

Para aprofundar o debate sobre a medida, os conselheiros decidiram reativar a comissão instituída pelo CD para discutir a carreira dos servidores junto ao Legislativo e ao Executivo em 2024, durante o processo de negociação salarial. O presidente da Asfoc-SN, Paulo Garrido, lembrou que, no início de fevereiro, representantes do sindicato levaram o tema para reunião com o secretário de Relações de Trabalho do Ministério da Gestão e Inovação no Serviço Público, José Lopez Feijóo. 

Presidência e Asfoc têm se reunido com representantes do Executivo e do Legislativo para rever pontos críticos da MP. Foto: Peter Ilicciev (CCS)

O presidente da Fundação, Mario Moreira, destacou a conversa que envolveu a Presidência da Fiocruz e o Secretário de Gestão de Pessoas, José Celso Junior. Na reunião, foram comunicadas ao secretário as articulações junto ao Congresso Nacional para apresentação de emendas que suprimissem esses itens e a importância do apoio do MGI a elas. 

O diretor-executivo da Fiocruz, Juliano Lima, falou sobre o apoio dos parlamentares à Fiocruz, em especial da deputada Jandira Feghali, que apresentou emenda à MP para supressão dos itens em questão, e do senador Confúcio Moura. 

Nessa semana, a Presidência da Fiocruz e a comissão do CD atuarão junto às instâncias do Executivo (Ministério da Saúde, Secretaria de Relações Institucionais e Casa Civil) e no Parlamento para tentar garantir que as emendas apresentadas pelos parlamentares se mantenham. No entanto, o cenário é difícil diante da correlação de forças entre Executivo e Legislativo quanto à LOA 2025 e à reforma ministerial e suas repercussões sobre a estratégia governamental para encaminhamento da MP.

Processo eleitoral nas unidades

Os conselheiros aprovaram, por unanimidade, as diretrizes para as eleições e para a elaboração dos regulamentos eleitorais das unidades da Fundação. O tema foi apresentado pelo diretor-executivo, Juliano Lima, que destacou alguns pontos do documento, agradeceu as contribuições recebidas e enfatizou elementos importantes dos processos, como a transparência. 

O documento debatido pelos conselheiros estabelece parâmetros gerais que deverão ser utilizados, respeitadas as particularidades das unidades. São questões de caráter mais sensível, onde podem ocorrer controvérsias, dúvidas frequentes ou tratamentos distintos entre as unidades. O processo eleitoral ocorrerá entre março e maio de 2025.

Homenagem a Wilson Savino

Durante a reunião do CD, o pesquisador Wilson Savino recebeu do embaixador da França no Brasil, Emmanuel Lenain, o título de cavaleiro da Ordem Nacional do Mérito. A honraria, concedida pelo Governo da França, é um reconhecimento da contribuição de Savino para a ciência e a cooperação franco-brasileira. O embaixador foi recebido pelo presidente Mario Moreira, que destacou que a visita também teve o objetivo de discutir o estreitamento das parcerias e colaborações científicas, acadêmicas, tecnológicas e industriais entre a Fiocruz e a França.  

Em seu discurso em português, o embaixador enfatizou os fortes vínculos entre a França e a Fiocruz e afirmou que a Fundação é o “verdadeiro símbolo da ciência brasileira e da parceria histórica entre as duas nações desde a viagem de Oswaldo Cruz”.  Lenain ressaltou a atuação de Savino, em especial, em colaborações com instituições e pesquisadores franceses. "Hoje, a França gostaria de expressar todo o seu reconhecimento por esses anos de trabalho e comprometimento com a excelência científica".

Savino foi homenageado por suas contribuições científicas e atuação no fortalecimento das parcerias entre Brasil e França. Foto: Peter Ilicciev (CCS)

Visivelmente emocionado, Savino lembrou sua trajetória. "Se aqui estou hoje é porque estudei praticamente toda a minha vida em escolas públicas brasileiras. As pesquisas desenvolvidas nessas décadas foram possíveis porque houve investimento de agências públicas de fomento à pesquisa e porque sempre fui acolhido por instituições públicas, primeiro pela UFRJ e depois pela Fiocruz”.

"Hoje, eu tenho a honra, mas também a responsabilidade de expressar o meu plural, com camadas de contribuições distintas e fundamentais, que me levaram estar aqui neste dia", declarou Savino. O presidente Mario Moreira lembrou que Savino é um ator importante no estreitamento e fortalecimento dos laços de colaboração com instituições francesas. 

“Além de ser um grande cientista, e seu currículo já nos informa sobre e, agora, com uma condecoração especial, Savino é um humanista. Isso é muito importante. Isso não está escrito no seu currículo, mas está escrito na sua trajetória, Savino”, afirmou Moreira.

Arboviroses

A coordenadora de Vigilância e Laboratórios de Referência, Tânia Fonseca, apresentou um informe sobre o cenário atual das arboviroses no país. Para este ano, a expectativa é de uma epidemia de dengue menor que a do ano passado. A estimativa do Programa de Computação Científica (PROCC) da Fiocruz é de que o Brasil tenha entre 3,5 e 4,5 milhões de casos da doença em 2025. Segundo o Painel de Monitoramento de Arboviroses do Ministério da Saúde, o país registrou mais de 6,4 milhões de casos de dengue ao longo de 2024. 

Tânia Fonseca reforçou a necessidade de estimular a testagem para as arboviroses. Foto: Peter Ilicciev (CCS)

Segundo Tânia, o avanço da oropouche tem chamado a atenção das autoridades e pesquisadores. A coordenadora informou que, pela primeira vez, cientistas identificaram um caso de transmissão vertical do vírus. Um protocolo de acompanhamento de gestantes com suspeita da doença está sendo elaborado pela Fiocruz, por meio do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI) e do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF), em parceria com a Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro. 

Também houve registros de pacientes com complicações neurológicas provocadas pela infecção. A maioria dos casos recentes de oropouche aconteceu na região Sudeste do país, em especial no estado do Espírito Santo. 

Em relação à febre amarela, Tânia afirmou que a preocupação maior é com a falta de notificação dos casos pelas autoridades e frisou que é fundamental reforçar a importância da vacinação contra a doença. A coordenadora também ressaltou a necessidade de estimular a testagem para as arboviroses em geral, com o objetivo de produzir dados mais precisos sobre o avanço das infecções, e informou que a Fiocruz estuda a possibilidade de retomar as ações coordenadas para o enfrentamento ao cenário. 

Nova política americana

Os conselheiros analisaram a política do novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e seus impactos sobre a saúde e a ciência global. Desde que assumiu o cargo, em 20 de janeiro, Trump vem preocupando líderes mundiais devido a medidas como a saída dos EUA da Organização Mundial de Saúde e do Acordo de Paris, tratado internacional que visa o enfrentamento às mudanças climáticas. O tema foi discutido na última edição do Informe sobre Saúde Global e Diplomacia da Saúde, editado pelo Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris) e disponível no Portal Fiocruz. 

Impactos da política de Trump na saúde e ciência globais voltarão à pauta em próximas reuniões do CD. Foto: Peter Ilicciev (CCS)

O diretor do Centro Colaborador para Diplomacia em Saúde Global e Cooperação Sul-Sul da Opas/OMS, Paulo Buss, explicou as semelhanças e diferenças entre as duas gestões de Trump, cujo primeiro mandato aconteceu entre 2017 e 2021. “Para a maior parte dos analistas internacionais, é um mandato muito similar ao primeiro, mas com muito mais empoderamento devido à ampla vitória eleitoral, com maioria na Câmara e no Senado e uma Suprema Corte claramente conservadora”, disse.

Buss destacou o fechamento da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês) como um dos atos mais significativos da nova gestão. “O centro do projeto de Trump é ‘América primeiro’”, lembrou. Buss frisou o impacto desta visão no financiamento das atividades científicas: “Temos tido notícias de que comissões avaliadoras de projetos têm sido substituídas pela fórmula ‘diga como este projeto pode fazer dos Estados Unidos um país mais forte, próspero e seguro’. As ações de Trump têm impacto profundo na saúde global. Progressos que vinham sido feitos, como no controle da poliomielite e nas questões climáticas, por exemplo, poderão sofrer estagnação ou até mesmo uma reversão”. 

Mario Moreira informou que a Fundação criará um fórum permanente para acompanhar a questão do financiamento das pesquisas por instituições norte-americanas. Foto: Peter Ilicciev (CCS)

O presidente da Fiocruz, Mario Moreira, relatou aos conselheiros que tem dialogado com diplomatas e lideranças dos EUA para compreender os impactos das medidas de Trump para a ciência global. Segundo levantamento do coordenador do Cris, Pedro Burger, com base em dados da Fundação de Apoio à Fiocruz (Fiotec), a Fundação tem, atualmente, 61 projetos vigentes com financiamento de agências americanas, totalizando um investimento de cerca de R$ 271 milhões. 

Desde o início da segunda gestão de Trump até a reunião do CD, apenas um projeto da Fiocruz havia sido impactado: não será estendido após seu término. Outro chegou a ser cancelado, mas a decisão foi revogada após negociações e o estudo, retomado por três meses. Mario informou que a Fundação está organizando um fórum permanente para acompanhar a questão do financiamento e propôs que o tema volte à pauta nas próximas reuniões do CD. 

Instituição Estratégica de Estado

O CD deu continuidade à discussão sobre a consolidação da Fiocruz como instituição estratégica para o Estado Brasileiro. O diretor-executivo Juliano Lima, apresentou um informe sobre os encaminhamentos externos e internos dessa questão. Segundo ele, junto ao governo federal está sendo elaborada uma proposta de acordo “para viabilizar o reposicionamento institucional da Fundação, estabelecendo as bases jurídicas, legais e administrativas, considerando sua complexidade e singularidade, para fortalecer e ampliar sua capacidade organizacional para o desempenho de suas funções”.

A negociação envolve órgãos como o Ministério da Saúde, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos e a Advocacia Geral da União (AGU). Internamente, cabe a Fiocruz fazer um diagnóstico da situação atual e sistematizar suas demandas. Por sugestão do presidente Mario Moreira, esse debate será pauta permanente do CD, “além de objeto de mobilização de nossa comunidade ao longo do ano, como parte essencial das atividades preparatórias do Congresso Interno”.

Concurso

Em seu informe, a coordenadora-geral de Gestão de Pessoas, Andréa da Luz Carvalho, comunicou ao CD que a chamada dos aprovados no Concurso Público Fiocruz 2023 acontecerá logo após a aprovação da Lei Orçamentária Anual pelo Congresso Nacional. Ela salientou, no entanto, que a Cogepe já está organizando a posse dos novos servidores, que será realizada em ambiente virtual para todas unidades, assim como as atividades de integração.

Orçamento

Pauta permanente nas reuniões do CD, o informe orçamentário apresentado pelo coordenador-geral de Planejamento Estratégico, Fábio Lamin, confirmou o déficit projetado no custeio de ações regulares, em parte “devido aos bloqueios orçamentários derivados da política de ajuste fiscal do governo”. Esse quadro foi mitigado por meio de negociações que permitiram o desbloqueio de uma pequena parcela do orçamento institucional e o remanejamento de recursos de investimento, “sem comprometer projetos de unidades aprovados pelo CD”. Mesmo assim, a Fiocruz encerrou 2024 com restos a pagar na ordem de R$ 147 milhões, com um déficit projetado para este ano de cerca de R$ 386 milhões.